sexta-feira, 29 de maio de 2015

CPI dos Lixões - Jornal O Globo

Projeto para aumentar índices de reciclagem no Rio enfrenta dificuldades para sair do papel
Plano previa construção de seis centrais de triagem, mas obra em Bangu está parada e a de outros três bairros nem começaram
POR MARCO GRILLO E MARIANA ALVIM
26/05/2015 5:00


Obra parada na futura central de Bangu: sucessivos atrasos - Fernando Lemos / Agência O Globo
RIO — A Central de Triagem (CT) de Irajá, que poderia dar emprego a 200 catadores, tem apenas 25 em atividade — além de receber lixo hospitalar e material orgânico, resíduos inapropriados para a reciclagem naquele espaço. Na Zona Portuária, dois vigias da Comlurb se revezam para tomar conta de um galpão vazio, trancado a cadeado, onde deveria funcionar outra central. Já em Bangu, catadores se movimentam em uma área improvisada, ao lado de um esqueleto de construção que deveria ser uma central operada por uma das cooperativas credenciadas para o serviço. De acordo com o Plano Municipal de Resíduos Sólidos, seis centrais de triagem seriam inauguradas até 2013, mas as unidades de Campo Grande, Penha e Jacarepaguá sequer saíram do papel. Um dos itens previstos no plano é o Programa de Ampliação da Coleta Seletiva, orçado em R$ 50 milhões. Mesmo financiado pelo BNDES, o projeto que pretende aumentar os índices de reciclagem na cidade encontra uma série de dificuldades para deslanchar.
Quando foi inaugurada pelo prefeito Eduardo Paes, em janeiro de 2014, a central em Irajá tinha a previsão de processar 20 toneladas de lixo reciclável. Segundo Evelyn Brito, presidente da Coopfuturo, cooperativa que atua no local, a unidade recebe atualmente cinco toneladas deste material — das quais 30% seriam rejeitadas por conter lixo orgânico ou hospitalar. Na última quarta-feira, várias seringas foram vistas no local. A Comlurb classificou a presença dos resíduos inapropriados de “fato isolado".
— A prefeitura prometeu também nos dar suporte com aquisição de equipamentos, mas eles estão defasados e sem manutenção. A prensa pesa mais de uma tonelada e é manual — reclama Evelyn.
Em Bangu, a obra de construção da Central de Triagem parou de vez no início deste ano. No galpão abandonado, há paredes, mas não há teto; há dois fossos abertos, acumulando água parada, mas não há as prometidas esteiras que facilitariam o trabalho de separação do lixo. Os vergalhões foram ficando enferrujados ao passo que a a data de inauguração foi sendo adiada — vários prazos foram descumpridos, e agora a Comlurb estima que a inauguração vai acontecer em outubro.
— Os equipamentos prometidos (pela prefeitura) não chegaram. Sem as máquinas, nossa produtividade cai muito — explica Custódio Silva, um dos líderes da cooperativa Recicla Mais Zona Oeste.
Eva Barbosa, outra líder do grupo, conta que os catadores chegaram a ficar em um espaço menor ainda, alugado pela empresa que era responsável pela construção da CT em Bangu. Em dezembro, passaram a usar o terreno ao lado da futura central.
— São espaços inapropriados para o nosso trabalho. Fica todo mundo apertado — afirma.
‘SUPERDIMENSIONAMOS O PROJETO’, AFIRMA SECRETÁRIO
Mais de quatro anos após a assinatura de contrato com o BNDES — que prevê a construção de seis centrais de triagem —, a prefeitura acredita que errou no tamanho da ampliação do programa de coleta seletiva. Segundo o secretário municipal de Meio Ambiente, Carlos Alberto Muniz, o plano agora é construir apenas três centrais:
— Acho que superdimensionamos o projeto. Planejamos estas seis unidades muito no calor do momento, da desativação do aterro de Gramacho (fechado em 2012). Acredito que precisamos de três centrais — afirmou.
A Comlurb afirma que a proposta original, que prevê a construção de seis centrais, “permanece no programa”, mas reconhece que não há novas obras em

andamento. Segundo a companhia, “não há oferta de resíduos que justifiquem as construções neste momento”.
Orçado em R$ 50 milhões, o projeto conta com R$ 22 milhões do BNDES — dos quais R$ 5 milhões já foram desembolsados, segundo o Portal de Transparência do banco — e R$ 28 milhões de contrapartida da prefeitura. O valor previsto para o município inclui o repasse de verbas, cessão de terrenos, contratação de garis e outras ações.
O acordo firmado com o BNDES é de “concessão de colaboração financeira não reembolsável”, o que significa que a prefeitura não vai retornar ao banco o valor investido. O BNDES explica que este tipo de contrato é usado em algumas linhas de crédito direcionadas para ações que buscam benefícios sociais, como seria o caso da geração de renda para os catadores. Os repasses são executados `à medida que a prefeitura apresenta os avanços no cronograma do contrato, que tem duração de 66 meses e expira em junho do ano que vem.
Em nota, o BNDES afirmou que acompanha o projeto por meio de contato “permanente” com a administração municipal. O banco destacou ainda que “a implantação dos projetos de reciclagem impõe desafios complexos e envolve processo de conscientização, organização social e educação ambiental para a melhoria da qualidade da coleta e da seleção dos resíduos sólidos”.
LIXO CONTAMINADO INTEROMPE TRABALHO DE CATADORES
Na semana passada, a chegada de lixo contaminado paralisou por sete dias o trabalho dos catadores em Bangu. Na noite de segunda-feira, três caminhões da Comlurb entraram no terreno da Rua Roque Barbosa. Quando os catadores separavam o lixo que veio no terceiro veículo, um cheiro forte tomou conta do ambiente. Alguns deles passaram mal, e a cooperativa decidiu interromper o trabalho. Os catadores acreditam que algum resíduo químico veio junto com o lixo oriundo da coleta seletiva. Em nota, a Comlurb ressaltou que a situação é “incomum” e que tomou “providências técnicas e ambientais imediatas". A Companhia destacou que os resíduos estão em processo de análise e que “foram adotadas medidas emergenciais no sentido de preservar a saúde dos catadores e garantir com segurança a continuidade dos trabalhos”.
— Depois, a gente precisa recuperar o tempo perdido com calma. Não adianta trabalhar correndo — conformou-se o catador Deílson Adelino.
Já na Gamboa, bairro da Zona Portuária, o pedaço da rua por onde deveriam circular os caminhões da Comlurb em direção à Central de Triagem virou área de estacionamento para vans. Pela fresta do portão (trancado a cadeado) do terreno que deveria estar aberto aos catadores, é possível observar o chão de terra batida e nenhuma máquina. À esquerda, há uma estrutura que começou a ser erguida e, segundo o vigia, há meses já não recebe mais a visita de nenhum operário.
— Eu venho aqui para tomar conta (do terreno), mas ninguém trabalha aqui — admite.


Hoje, apenas 0,7% do lixo coletado diariamente pelo município é destinado aos 18 núcleos de catadores para a reciclagem — 70 toneladas de um total de dez mil, segundo dados da Comlurb. Em 2012, o índice era de 0,27%, e a prefeitura espera chegar a 5% até 2016.
A despeito dos baixos índices de coleta seletiva e dos atrasos na construção das centrais de triagem, a Comlurb garante que o projeto está em expansão. Segundo a companhia, desde 2013, o número de bairros atendidos pelo programa de coleta seletiva subiu de 44 para 113. A quantidade de garis que atuam exclusivamente no serviço passou de 35 para 120, e o de caminhões aumentou de sete para 16. A Comlurb diz que já foram gastos R$ 28 milhões, com origem no tesouro municipal e no BNDES, na construção e compra dos equipamentos das centrais de triagem, na divulgação e na capacitação dos catadores.
A Comlurb afirmou que o atraso na entrega da CT de Bangu foi provocado pelo descumprimento dos prazos pela empresa que havia sido contratada. Em relação à unidade da Zona Portuária, a companhia reconheceu que houve uma mudança de planos. A central deverá ser transferida para o Caju, “devido ao planejamento urbanístico da região do Porto Maravilha”. Segundo o deputado estadual Dr. Sadinoel (PT), presidente da CPI dos Lixões, representantes da Comlurb e do BNDES serão convocados a prestar esclarecimentos sobre o programa.

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